Quanto mais fedido, melhor? Os queijos que assustam no cheiro e hipnotizam no sabor

sexta 17 outubro 2025 15:00 - Mirella Mendonça
Quanto mais fedido, melhor? Os queijos que assustam no cheiro e hipnotizam no sabor

Se você já abriu uma geladeira e pensou “meu Deus, que cheiro de podre é esse?”, é bem provável que a culpa seja de um bom queijo.

Sim, alguns queijos realmente fedem e quanto mais fortes, mais “aromáticos” e intensos ficam com o tempo. Mas aqui vai o segredo que os especialistas confirmam: esse cheiro não é defeito. É qualidade.


O “cheiro forte” é o perfume dos queijos

Pode soar estranho, mas o cheiro forte é o resultado de um processo natural e essencial: a maturação.

Quando um queijo envelhece, bactérias e fungos benéficos transformam suas proteínas e gorduras em compostos aromáticos.

Essas substâncias — como o ácido butírico e o amoníaco — são as responsáveis por aquele odor marcante que muita gente ama (ou foge).

Em outras palavras: o mesmo processo que faz o queijo “feder” é o que também o deixa mais saboroso, cremoso e complexo.

Quanto mais o queijo “amadurece”, mais ele desenvolve características únicas de aroma e sabor.

É por isso que queijos como Camembert, Roquefort, Gorgonzola e Munster têm cheiros tão intensos — são queijos “vivos”, cheios de micro-organismos que continuam atuando mesmo depois de embalados.

Queijos notoriamente “fedidos” (e adorados por isso):

1. Époisses (França)

  • Considerado por muitos o queijo mais fedido do mundo
  • Amadurecido com conhaque; casca laranja, pegajosa e altamente aromática

2. Munster (França, região da Alsácia)

  • Cheiro animal e forte, mas sabor suave e amanteigado
  • Muito tradicional na culinária regional francesa

3. Limburger (Bélgica/Alemanha)

  • Aroma fortíssimo de chulé (literalmente), mas paladar surpreendentemente doce e suave

4. Taleggio (Itália)

  • Cheiro pungente, mas sabor delicado, levemente frutado
  • Excelente para derreter e combinar com massas ou risotos

5. Roquefort (França)

  • Queijo azul de ovelha com mofo natural; cheiro intenso e sabor salgado, picante
  • Um clássico entre os azuis mais potentes

6. Blue Stilton (Inglaterra)

  • Queijo azul com aroma penetrante e sabor forte, mas equilibrado
  • Muito usado em tábuas ou como ingrediente em pratos sofisticados

7. Gorgonzola (Itália)

  • Aroma forte, especialmente na versão “piccante” (curada)
  • Cremoso, ideal para molhos e risotos

8. Camembert (França)

  • O cheiro vai se intensificando conforme amadurece
  • Cremoso por dentro, com casca branca de mofo comestível

9. Brie de Meaux (França)

  • Menos agressivo que o camembert, mas ainda assim com aroma de amônia quando bem curado

10. Pont-l'Évêque (França)

  • Casca lavada, cheiro pungente e sabor cremoso com notas de terra úmida

Bactérias do bem (sim, elas existem!)

Antes que você imagine algo nojento, vale lembrar: essas bactérias são boas.

Elas fazem parte da produção artesanal dos queijos e são totalmente seguras para o consumo.

Por exemplo:

  • O Penicillium roqueforti é o fungo responsável pelas veias azuis e pelo aroma do Roquefort e do Gorgonzola.
  • O Brevibacterium linens, presente na casca de queijos como o Limburger, é o mesmo tipo de bactéria que vive na nossa pele — e é ele que dá o famoso “cheiro de chulé” (sim, o mesmo).

Mas calma: esse cheiro pode até lembrar um pé suado, mas o sabor é rico, amanteigado e levemente picante — uma explosão de complexidade que só queijos maturados têm.

O poder do tempo

Assim como o vinho, o queijo melhora com o tempo — desde que seja o tipo certo e armazenado da forma ideal.

A maturação pode durar de alguns dias a vários meses, dependendo do estilo.

Durante esse período, ocorrem transformações químicas fascinantes:

  • As proteínas se quebram, deixando o queijo mais macio.
  • As gorduras liberam aromas e sabores intensos.
  • E os fungos e bactérias criam o “cheiro de queijo de verdade”.

Por isso, não julgue um queijo pelo cheiro.

Aquele odor forte é sinal de vida, fermentação e autenticidade — o oposto dos queijos ultraprocessados, sempre idênticos e inodoros.

Na França, o fedor é sinônimo de prestígio

Os franceses, mestres dos queijos, têm um ditado curioso: “Quanto mais o queijo fede, melhor ele é.”

E eles levam isso a sério.

Mercados franceses são cheios de queijos com aromas intensos — e os consumidores disputam os mais “perfume forte”, como se fossem vinhos raros.

No Brasil, essa cultura ainda assusta um pouco, mas está mudando: cada vez mais pessoas estão descobrindo o prazer dos queijos artesanais maturados, com personalidade e sabor de verdade.


E se o cheiro for demais?

Tudo tem limite, claro.

Um queijo “bom fedido” tem aroma forte, mas agradável, lembrando nozes, manteiga, terra ou até alho suave.

Mas se o cheiro for azedo, podre, rançoso ou de mofo preto, aí sim é sinal de que passou do ponto.

Dica prática:

  • Se a casca estiver pegajosa demais ou com bolores escuros, descarte.
  • Se for só o cheiro forte, mas o queijo estiver íntegro, firme e com sabor equilibrado — pode confiar: está perfeito.

Curiosidade: o cérebro e o cheiro de queijo

Pesquisas mostram que o cérebro humano reage ao cheiro de queijo da mesma forma que ao de alimentos fermentados como café e chocolate.

No início, ele estranha, mas depois reconhece as notas de prazer e recompensa.

É por isso que, com o tempo, o paladar se acostuma — e o que antes parecia “fedido” vira delicioso e viciante.

Em resumo:

O “cheiro forte” de certos queijos não é um defeito: é o sinal de que eles amadureceram com maestria.

São queijos vivos, complexos e cheios de personalidade, feitos com paciência e técnica.

Então, da próxima vez que abrir a geladeira e sentir aquele aroma inconfundível, não torça o nariz.

Pode ser apenas o seu queijo dizendo: “Estou no ponto certo.”

Ou seja: 

Alguns queijos realmente fedem mais que os outros — e isso é um ótimo sinal.

Significa que estão maduros, autênticos e prontos para surpreender o paladar.

Porque, no fundo, o verdadeiro segredo do queijo não está no cheiro…

Está na coragem de provar.

Mirella MendonçaMirella Mendonça
Sou responsável editorial do Petitchef (Portugal e Brasil) e uma grande apaixonada por viagens e pela gastronomia do mundo, sempre em busca de novos sabores e experiências. No entanto, por mais que ame explorar as delícias de diferentes culturas, a cozinha da minha mãe sempre será a minha preferida, com aquele sabor único que só ela consegue criar.

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